sábado, 10 de fevereiro de 2024

Existem evidências históricas de que os hebreus estiveram no Egito?

Existem. Registros, notas, informações, abundantes e nada elogiosos.

Durante o Médio Império, o Egito incentivou a migração e assentamento de povos asiáticos para o Delta do Nilo, de modo a desenvolver uma região até então pobre, vazia e com povoamento esparso. Falavam uma língua estrangeira, e foram responsáveis por introduzir o cavalo no Egito.


Quando o Médio Império entrou em crise, em 1803 A.E.C., os colonos se rebelaram, e tomaram o poder. Passariam para a História como os "Hekau Khasut" - Hicsos - ou "Soberanos Estrangeiros", que tomaram, primeiro o Delta do Nilo, e depois, o restante do país. Reinariam soberanos pelos 150 anos seguintes.

As fontes egípcias indicam claramente a origem geográfica desses povos - Retenu, que os hebreus denominavam Canaã. Baseados em Avaris, adequaram os costumes egípcios aos seus, e criaram uma religião sincrética, combinando Set com Baal, que, segundo algumas fontes, era a única divindade que veneravam.

E aqui os relatos divergem bastante da evidência concreta. Segundo os relatos egípcios, especialmente aqueles que nos chegaram por Maneto e Flávio Josefo, os Hicsos foram derrotados e expulsos. A evidência arqueológica, contudo, demonstra que não foram expulsos, mas permaneceram em território egípcio, migrando gradualmente. Perderam a condição de mando, e muitos possivelmente foram escravizados. Os seus templos pararam de ser mantidos, e eventualmente, no reinado de Ramsés I, Avaris foi demolida para dar lugar a Pi-Ramesses.

E os hebreus? Os hebreus eram, nesse momento, virtualmente indistinguíveis dos cananitas. Falavam a mesma língua, tinham os mesmos costumes, e no mais, não é claramente possível distingui-los nos relatos egípcios. Mas há certos indícios de diferenciação, no século XV A.E.C. - quando fontes egípcias falam dos Shashu, pastores nômades da terra de Retenu, ou os Habiru, conforme relatos de cidades-estado cananitas que estavam sob vassalagem do Faraó.

Aqui entra uma dúzia de fontes conflitantes e muito posteriores a essa época, que falam de Moisés, ou Osarseph (s. Maneto); um sacerdote que tentou estabelecer uma fé monoteísta e se insurgiu contra a religião egípcia, no fim abandonando o Egito e "colonizando a Judéia" (Hecateu de Abdera), ou que teria sido "expulso com seu exército de leprosos" (Maneto). Há também um relato original, na Estela de Elefantine, referente ao reino de Setnakhte (1189–1186 A.E.C.) sobre um Shashu que teria se insurgido contra os deuses egípcios, comandado a destruição de templos, eventualmente "sendo expulso" do Egito. Esta figura recebe o nome de Irsu no Papiro Harris, e ambos os documentos atestam que ele próprio e seus seguidores eram asiáticos, caracterização que está presente também em Maneto.

Juntando os indícios, temos que:Os Hicsos não foram propriamente expulsos; perderam status, e migraram aos poucos para Canaã, que veio a cair sob vassalagem egípcia nos séculos seguintes. Conforme os relatos egípcios, tinham uma religião henoteísta (isto é, reconheciam vários deuses, mas admitiam a veneração de apenas um), centrada em Set-Baal.
Sob o Novo Império, ocorreram ao menos duas tentativas de estabelecer uma fé monoteísta no Egito; uma sob Akhenaton (1346–1334 A.E.C.), e outra sob Irsu, no reinado de Setnakhte (1189–1186 A.E.C.). A primeira foi quase apagada da História, e a segunda parece ter implicado numa migração, ou expulsão, dos adeptos, que são textualmente identificados como asiáticos.
Pastores semi-nômades aparecem nos textos do século XV A.E.C., denominados Shashu, cuja presença é identificada desde Retenu até o Baixo Egito. Nas Cartas de Amarna, conjunto de correspondências entre os vassalos cananitas e os suseranos egípcios, pastores semi-nômades também são descritos nas zonas de fronteira, mas pelo nome Habiru.

Basicamente, a partir de 1500 A.E.C., pastores semi-nômades começaram a aparecer aos montes em Retenu. Quando o Cataclisma da Idade do Bronze ocorreu, e o Egito e seus domínios foram engolfados pelos ataques dos Povos do Mar, os Habiru desaparecem de cena, e os Hebreus tomam o controle de Canaã.

Parece-me não ser irrazoável supor que esses Habiru ou Shashu, descritos em estelas, tabuletas, e mesmo papiros que chegaram aos dias de hoje, cuja presença no Egito e em Canaã é atestada em diferentes momentos e circunstâncias, sejam os próprios Hebreus.

Cabe mencionar aqui também a Estela de Merneptá, datada de 1208 A.E.C. (portanto antes de Irsu), que afirma, entre os feitos do Faraó Merneptá, que "Israel foi devastada - sua semente se perdeu". É a mais antiga menção a Israel que existe; não é claro, contudo, o que Israel é nesse texto - se um povo, uma tribo, uma cidade, ou uma região. Mas o restante dos feitos relatados tratam de vitórias militares na Líbia, contra os Hititas, e contra Canaã.


O Cataclisma da Idade do Bronze fez o domínio egípcio sobre Canaã retroceder. Perderiam o controle sobre a região até a Era dos Ptolomeus. Sabe-se que, a por volta de 1200 A.E.C., diversas novas vilas foram fundadas nas regiões de colinas de Canaã, na região hoje correspondente à Cisjordânia. E sabe-se - pelos resíduos alimentares desses assentamentos - que diferentemente dos cananeus, não comiam porco.

Os assentamentos se multiplicaram ao longo do Cataclisma, cada vez mais se aproximando das cidades cananitas. Ainda não se sabe como, mas os costumes dentro das cidades cananitas foi se transformando. Foi se tornando mais parecido com os povos circundantes; a cerâmica, mais austera, a alimentação, regrada, e a arquitetura passou a incorporar pátios centrais nas cidades e vilas. Surge nesse período a figura do Shofet, ou juiz, que está presente tanto na organização política judaica, quanto na fenícia.

Posteriormente, com o avanço dos Filisteus (que, conforme relatos egípcios, foram um dos "Povos do Mar"), a população local criou uma unidade política para melhor resistir.

Para resumir: Sim, existem indícios. Eles são esparsos, misturam diversos elementos, mas quando examinados em conjunto, permitem uma percepção mais clara.

Nenhum comentário:

Postar um comentário