segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

A terrível, monstruosa e abominável "Inquisição Protestante"


(Imagem do monge rebelado pregando as teses da inquisição protestante)

Revisionismo histórico é quando um bando de sem vergonhas tenta desesperadamente mudar aquilo que está consumado perante a história mundial, mediante truques baixos e uma nova literatura formada especificamente para este objetivo. Existem, por exemplo, revisionistas nazistas, que são os “historiadores” que tentam dizer hoje que o holocausto judeu nunca aconteceu, ou que, se aconteceu, não morreu quase ninguém. Um certo Porcão que detesta o povo israelita mantém este ponto de vista inescrupuloso, assim como outros dementes por todo o mundo, inclusive alguns de batina.

No caso do catolicismo, a tentativa consiste, primeiramente, em negar absolutamente tudo o que os livros de história, os livros escolares, os historiadores do passado, a opinião popular e acadêmica, enfim, o que todos afirmaram por séculos sobre a inquisição católica. Como eles estão desesperados, perdendo fieis até para a Seicho-No-Ie e para a Umbanda, decidiram revisar tudo o que já foi escrito até então sobre inquisição para “concluir” que ela nunca existiu, ou então que nunca torturou ninguém, ou que matou meia dúzia de gatos pingados. Ou seja: a mesma estratégia dos neo-nazistas.

Mas a apologética católica, mentirosa como sempre, não se contenta apenas em negar os horrores da inquisição real. Nos últimos anos, alguns lunáticos foram além, chegando até mesmo a inventar uma monstruosa e abominável “inquisição protestante”(!), essa sim uma inquisição de verdade, terrível, assombrosa, que matava um tantão de gente, e que por alguma razão misteriosa nunca constou nos livros de história, embora curiosamente pipoque de montão nos blogs católicos. É como se um nazista, não satisfeito em negar o holocausto nazista, ainda dissesse que o “verdadeiro” holocausto foi dos judeus matando milhões de nazistas...

Sem ter conta do senso do ridículo, os picaretas ainda conseguem iludir um punhado de zumbis bitolados que tem horror aos livros de história e que, em vez de lê-los, prefere ver videozinhos do padre Gargamel Paulo Ricardo ou do Paulo Porcão (ou pior ainda, ler o Fakenando Nascimento). Alguns chegam a descer mais ainda, ao ponto de se basear em artigos de um astronauta católico.

O que eles chamam de “inquisição protestante”, na verdade, jamais foi uma inquisição e muito menos tinha este nome. Trata-se de alguns eventos isolados sem nenhuma conexão entre si, que os vigaristas juntam em um artigo tosco e tentam relacionar todos eles a uma fantasmagórica e lendária “inquisição protestante”. De todos os casos citados, o que é sempre o mais referido em 99% das vezes é o da guerra dos camponeses, em que Lutero teria sido responsável pelo assassinato de 30 mil camponeses. Daí concluem que Lutero criou uma “inquisição” para matar os pobres camponeses indefesos...

O livro que todos eles citam (um copiando do outro), mas que nenhum deles leu, é a “História Universal”, de Veit Valentin. Por coincidência, encontrei este livro na biblioteca enquanto procurava por mais livros sobre Idade Média, Cruzadas e Reforma Protestante. Passei essa última semana lendo os dois volumes e vi, como já era de se esperar, a forma com que os embusteiros sem caráter tiraram totalmente do contexto as palavras de Valentin e todo o contexto que envolve a guerra dos camponeses. Irei deixar para comentar especificamente sobre este livro deturpado pelos apologistas católicos em um artigo dos próximos dias, e aqui me limitarei apenas a mostrar o que o autor diz sobre essa tal “inquisição” protestante.

A citação de Valentin que eles tiram do contexto e que é repetida à exaustão pelos blogs católicos é a seguinte:

“Infrutíferos, que Münzer crescia, pôs-se ao lado das autoridades e descarregou como uma bomba o seu escrito... Um documento de inclemência e de ódio, só compreensível como uma arma de combate contra o diabo, que Lutero via em Münzer e nos seus... Sufocaram a revolução dos camponeses com crueldade que mesmo naqueles rudes tempos causou horror. O furor, as torturas, as violências e as batalhas, pareciam que não teriam mais fim; pelo menos 30.000 camponeses perderam a vida”

O catoleigo sem instrução e sem conhecimento histórico que lê uma citação como essa, cheia de reticências, cortes e totalmente pincelada, pensa que o Lutero malvadão mandou matar 30.000 camponeses indefesos, que, pobrezinhos, nada estavam fazendo de errado e nada podiam fazer para se defender dessa monstruosa “inquisição protestante” armada pelo monge rebelado filho da serpente...

O que os vigaristas escondem é que o próprio Valentin, ao longo de todo o livro, faz questão de ressaltar que estes camponeses eram revolucionários arruaceiros, saqueadores, que destruíam tudo por onde passavam e que ameaçavam matar bem mais gente para levar adiante aquela que seria a primeira revolução da história, se não tivesse sido repelida pelo Estado. O autor em questão afirma:

“Em Zurickan surgiu uma corrente profética mística que se propagou até Wittenberg provocando tumultos e fervores fanáticos e degenerando numa lamentável e estúpida fúria iconoclasta. Movimentos semelhantes, verificaram-se em muitas outras localidades. Lutero tinha horror a esse proselitismo, nada lhe repugnava mais do que a multidão enfurecida e sequiosa de destruição[1]

Quem assistiu ao filme de Lutero deve se lembrar desta parte. Os camponeses revoltados, até aquele momento simpatizantes de Lutero, tumultuavam, saqueavam e destruíam tudo o que viam pela frente, sendo severamente repreendidos pelo próprio Lutero, que fez questão de mostrar que não era a favor deste movimento e que o repugnava. Mas os camponeses furiosos não queriam saber da opinião de Lutero, e continuavam fazendo suas bandidagens por onde passavam. Veit escreve:

“Bastilhas e mosteiros foram demolidos por eles, os bens monásticos divididos, o nobre dali por diante teria de viver como o camponês, a proteção do núcleo de seu patrimônio ficava a cargo de um ‘conselho rural’. Pior foi a destruição de preciosos monumentos eclesiásticos, tesouros de arte e bibliotecas; execráveis foram os maus tratos e o escárnio a que se submeteram os padres, monges e freiras”[2]

Como vemos, estes camponeses extremistas, muito diferente do que os apologistas católicos mentirosos tentam nos passar, não eram pessoas pacíficas e amigáveis que foram repelidas pela força do Estado em função de uma suposta “inquisição protestante”. Muito pelo contrário: eram bandidos travestidos de “revolucionários”, sobre os quais Valentin diz que lutavam por “um comunismo elementar de subsistência”[3]. Eram um MST numa versão muito mais agressiva, extremista e radical. Valentin deixa claro que Lutero era totalmente contra o que eles vinham fazendo:

“A Lutero desagradavam profundamente todas essas coisas. Seu reino não era deste mundo; realmente importante para ele só podia ser a eternidade; se o temporal queria impor-se assim não o toleraria. E dirigiu-se como conciliador a ambas as partes; atirou-se, impávido como sempre, ao encontro do aniquilamento, tentando conciliar. Quando viu que seus esforços eram infrutíferos, que Münzer crescia, pôs-se ao lado das autoridades e descarregou como uma bomba o seu escrito: ‘Contra os bandos de camponeses assassinos e ladrões’”[4]

Ou seja: mesmo vendo que os camponeses eram radicais, extremistas, revolucionários e que representavam uma ameaça real à segurança da nação, ele ainda fez questão de tentar primeiro pelas vias conciliatórias, tentando convencê-los a parar com a bandidagem. Mas ele não conseguiu. Os camponeses revoltados eram intransigentes e estavam absolutamente determinados a levar a cabo a “revolução”. Só depois que Lutero viu que não tinha como se omitir e muito menos como convencer os camponeses a mudar de atitude, é que ele escreve sua obra em que defende que o poder civil faça uso da força para reprimi-los.

Mesmo assim, Valentin é claro em dizer que os príncipes não fizeram a matança por causa de Lutero, porque, de uma forma ou de outra, eles iriam defender seu território contra a revolta:

“E afinal os príncipes, os nobres, a Liga Suábia não precisavam das advertências luteranas para se defenderem. Sufocaram a revolução dos camponeses com uma crueldade que mesmo naqueles rudes tempos causou horror...”[5]

Só um asno sem cérebro acredita mesmo que os príncipes do Estado, vendo seus territórios sendo conquistados, seus patrimônios sendo depredados e a vida deles e de suas famílias sendo colocadas em risco, mesmo assim não matariam ninguém se não fosse pelo Lutero malvadão escrever um livro em que defende essa atitude...

Na posição em que Lutero se encontrava, ele não podia ser omisso. Ele tinha duas opções: ou ficava do lado dos camponeses, ou ficava do lado do Estado. Se ele ficasse do lado do Estado, não teria como combater um exército gigante de camponeses revoltados com flores nas mãos, da mesma forma que não dá para vencer os terroristas do ISIS com balas de borracha. Em uma luta corpo-a-corpo, é matar ou morrer.

Naquelas condições, Lutero escolheu a primeira opção. O único erro do Estado foi ter usado uma força excessiva, praticando tortura (de acordo com o que diz Valentin). Mas Lutero em momento nenhum disse para torturar os camponeses, apenas para defender o território e matar em um contexto de guerra. E vale ressaltar, mais uma vez, que o próprio Valentin disse que a opinião de Lutero foi irrelevante. Os príncipes iriam defender seu território independentemente da opinião de Lutero.

Alguém poderia ainda sugerir que seria melhor que Lutero tivesse ficado ao lado dos camponeses, então. É o que os apologistas católicos, que não entendem porcaria nenhuma do que estava acontecendo, parecem sugerir. No entanto, a história nos mostra as consequencias catastróficas de uma revolução comunista. Essas revoluções já mataram mais de 100 milhões no mundo, dados extraídos do “Livro Negro do Comunismo”, e continuam matando até hoje. Junto a isso, o comunismo sempre trouxe consigo profunda decadência econômica, favorecendo com isso regimes ditatoriais, trabalhos forçados e outros milhões que morrem de fome.

Ou seja: por pior que possa ter sido a morte de 30 mil arruaceiros revolucionários, pode apostar que seria muito pior se o contrário tivesse ocorrido, isto é, se os revolucionários tivessem ganhado a guerra e implantassem um regime comunista naquele lugar. Não apenas um tanto muito maior de pessoas morreria, como também acarretaria em uma enorme crise econômica por toda a Alemanha, que muito dificilmente seria a potência mundial que é hoje. Gerações após gerações viveriam na miséria, na fome e no caos. Isso sem falar no fato óbvio de que uma revolução bem sucedida dos camponeses alemães iria suscitar novas revoluções no resto do mundo; afinal, os demais camponeses iriam criar esperanças de sucesso ao ver as conquistas do outro, o que resultaria em mais banho de sangue.

Valentin não diz quantos camponeses estavam lutando, mas outro historiador, David Christie-Murray, diz que eram 300 mil(!), um exército enorme para os padrões da época, muito superior a qualquer cruzada católica em direção à Terra Santa. Um exército de 300 mil revolucionários baderneiros era um potencial para um baita estrago na Europa, se tivessem vencido a guerra. Se isso tivesse acontecido, Lutero seria hoje responsabilizado pelos católicos por ser o primeiro “revolucionário”, ou seja, por ser o primeiro líder da primeira grande revolução bem-sucedida no planeta. Mas como ocorreu o inverso, Lutero é culpado mesmo assim: mas por ter ficado contra os camponeses!

Para os apologistas católicos, Lutero seria culpado de um jeito ou do outro. Ele sempre tem que estar errado sobre tudo. Se ficasse do lado dos camponeses, seria o culpado pela morte dos civis inocentes que não escapariam das mãos dos revolucionários. Por ter ficado do lado oposto, passou a ser o culpado pela morte dos camponeses assassinos que tocavam o terror na Alemanha, mas que mesmo assim são descritos da forma mais bonitinha possível pelos apologistas católicos, que pensam que Lutero mandou matar pobres inocentes indefesos em um contexto de paz e amor...

Valentin descreve esses camponeses bonzinhos da apologética católica de “comunistas-terroristas”:

“Em Münster na Westfália ocorreu uma série de movimentos espirituais: oposição rústico-burguesa, agitação apocalíptica. Surgiu o Estado anabatista, notável pelo fanatismo quanto à fé e ambição de poder terreno, uma temerária tentativa de criar na grande família uma nova sociedade comunista-terrorista. Todos os vizinhos coligaram-se contra essa revolução fantástica e prepararam um fim horrível aos seus prosélitos e líderes, o ‘rei’ João de Leiden na sua frente”[6]

E a prova mais clara de que o próprio Valentin não culpava Lutero por este episódio está nas próprias descrições do autor sobre o reformador protestante. Ele escreve sobre o “monge rebelado”:

“Sua influência crescia, todos lhe pressentiam a superioridade não só no saber, e na consciência, como no caráter. O caráter alemão personificado em ação, genuíno, desprendido, espiritual, sobretudo moralmente seguro de si, impregnado do sentimento nacional, estava concentrado nele humana e espontaneamente e por isso mesmo mais arrebatador”[7]

E também:

“Lutero, este verdadeiro alemão, é, num sentido elevado, digno de estima. Nele cascateava caudalosa a torrente de Deus; nisto foi único, não tendo tido sucessores”[8]

E também:

“O luteranismo conservou sempre algo de quietista; era, se não um isolamento monástico do mundo, um isolamento do grande no pequeno mundo, um renunciar às lutas políticas históricas para entregar-se ao tranquilo convívio de todos os dias com os seus pequenos e agradáveis prazeres”[9]

Quem é, em sã consciência, que, conhecendo a história de um bêbado malvadão que mandou matar na “inquisição protestante” 30.000 camponeses inocentes bonzinhos que não fizeram nada de errado, ainda assim o descreve como sendo um exemplo no caráter, genuíno, espiritual, “verdadeiro alemão”, digno de estima, que estava sob a torrente de Deus, e cuja vertente religiosa era “quietista” e renunciava às lutas políticas para ter um convício tranquilo e pacífico com todas as pessoas? Está óbvio que os canalhas da apologética católica estão distorcendo grosseiramente as palavras de Veit Valentin, de forma sorrateira e criminosa, esperando que ninguém leia o livro referenciado para desmascará-los.

Em suma, o autor citado pelos apologistas católicos para embasar uma suposta “inquisição protestante”:

• Nunca descreveu a guerra dos camponeses como sendo uma “inquisição”, muito menos protestante.

• Nunca disse qualquer coisa sobre aquilo ser fruto de intolerância religiosa (os camponeses eram, inclusive, simpatizantes de Lutero, que tentava convencê-los na base do diálogo a deixar a bandidagem).

• Nunca retratou esses camponeses como “inocentes”. Ao contrário: disse que eram bandidos, saqueadores, que depredavam as igrejas, quebravam as imagens, destruíam as bibliotecas e tentavam criar uma «nova sociedade comunista-terrorista»!

• Nunca disse que Lutero foi o “responsável” pela morte dos camponeses no campo de batalha. Ao contrário, disse que a opinião de Lutero era irrelevante, porque de qualquer forma os príncipes iriam defender seus territórios assim mesmo.

• Nunca disse que Lutero cometeu um erro ao ficar do lado do poder civil e contra os camponeses revolucionários. Ao contrário, ressaltou que Lutero era um exemplo de caráter, genuíno, espiritual e digno de estima.

Essa, amigos, foi a terrível, monstruosa e abominável “inquisição protestante”, inventada diretamente pelos lunáticos da apologética católica.

Agora já podemos voltar a falar da inquisição católica, ou seja, a que existiu. Para o lixo o revisionismo mentiroso.

Paz a todos vocês que estão em Cristo.

Por Cristo e por Seu Reino,

Nenhum comentário:

Postar um comentário